por Bruno Pereira
O artigo "Aspectos da economia do crime em unidades prisionais da região metropolitana de São Paulo: elementos teóricos e evidências empíricas" do Professor da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Pery Shikida, apresenta uma análise profunda sobre a relação entre aspectos sociais e econômicos com a criminalidade, utilizando evidências empíricas obtidas em pesquisas com detentos em unidades prisionais da região metropolitana de São Paulo.
O estudo busca compreender os fatores que levam indivíduos a se envolverem em crimes econômicos, explorando aspectos familiares, educacionais e profissionais dos entrevistados, assim como suas percepções sobre a criminalidade e as motivações para cometer delitos. Ao longo do artigo, são expostos dados relevantes sobre o perfil socioeconômico dos detentos, as motivações para a prática de crimes, e a percepção deles sobre o sistema penal e a eficácia das políticas públicas de combate ao crime.
Perfil Socioeconômico dos Detentos
Os dados sociodemográficos dos presos indicam um cenário de baixa escolaridade e instabilidade familiar. A maior parte dos entrevistados não completou o ensino fundamental e foi criada em lares desestruturados, com separações frequentes entre os pais. A maioria dos entrevistados afirmou ter interrompido os estudos devido ao envolvimento com o crime ou à necessidade de obter renda para sustentar a família.
Outro ponto relevante diz respeito às condições econômicas dos detentos antes de suas prisões. Cerca de 41% dos entrevistados estavam trabalhando no momento do crime, com uma significativa parcela atuando no mercado informal. Mesmo entre os que estavam empregados formalmente, o retorno econômico advindo das atividades ilegais era consideravelmente superior ao do trabalho lícito, o que reforça a escolha pela criminalidade como um meio de maximizar os ganhos financeiros.
Motivações para a Criminalidade
A pesquisa revela que as principais motivações para a prática de crimes econômicos são a ambição de ganhos fáceis, a ganância e a indução por parte de outras pessoas. Fatores como a manutenção do vício em drogas e a falta de estrutura familiar também aparecem como razões significativas, indicando uma correlação entre a vulnerabilidade social e a criminalidade.
A ideia de maximização do bem-estar através do crime é uma constante nas respostas dos detentos, o que sugere que muitos consideram o crime uma atividade racional, onde os benefícios superam os custos. A análise da relação custo-benefício mostra que 91,2% dos entrevistados acreditam que os ganhos financeiros do crime superam os riscos e custos associados, evidenciando que, na percepção dos detentos, a criminalidade compensa.
Modus Operandi e Contexto do Crime
Um aspecto importante do estudo é a identificação do "delinquente flex", um termo utilizado para descrever indivíduos que cometem diferentes tipos de crimes conforme a oportunidade. A pesquisa mostra que a maioria dos entrevistados estava envolvida em atividades criminosas que variavam entre roubo, tráfico de drogas e furto, com muitos deles trabalhando em parceria com outros criminosos. O uso de armas de fogo foi comum, com mais de 64% dos presos afirmando possuir uma arma no momento da detenção, sendo que 90% utilizaram a arma em pelo menos um crime.
A chance de sucesso nos crimes econômicos foi estimada em 80% no Estado de São Paulo, um número alto, porém em comparação a outros estudos, é o menor já encontrado. Isso indica que, para cada dez crimes cometidos, apenas dois resultaram em prisão. Esses dados refletem uma realidade preocupante, onde a baixa probabilidade de ser preso e a ineficácia do sistema de segurança pública tornam o crime uma atividade atraente para indivíduos dispostos a correr riscos.
Percepção dos Detentos sobre o Sistema Penal e Políticas Públicas
A pesquisa também abordou as percepções dos detentos sobre o sistema jurídico e as políticas de combate ao crime. A maioria dos entrevistados demonstrou descrença tanto no sistema de justiça quanto na política brasileira. Apenas 28,7% dos presos acreditam no sistema jurídico, enquanto 40% atribuíram nota zero aos políticos do país.
Quando questionados sobre as punições que consideram suficientes para dissuadir o crime, a maioria dos detentos mencionou a pena de morte e a prisão perpétua como medidas eficazes. No entanto, um aspecto curioso do estudo é a ênfase na perda moral como o maior temor ao cometer crimes, superando até mesmo o medo de ser preso ou da intensidade da pena. Muitos entrevistados revelaram preocupação com a perda de reputação, especialmente diante dos familiares, o que sugere uma dimensão psicológica relevante na análise da criminalidade.
Sugestões para Redução da Criminalidade
Os detentos ofereceram sugestões sobre o que acreditam que poderia reduzir os índices de crimes econômicos. As principais sugestões incluem a criação de mais oportunidades de emprego, educação de qualidade e a reintegração dos presos à sociedade. Essas respostas indicam que, apesar do envolvimento com o crime, muitos entrevistados reconhecem a importância de políticas públicas que promovam inclusão social e ofereçam alternativas viáveis ao crime.
No entanto, quando questionados sobre a redução de crimes violentos, como estupro e feminicídio, as sugestões dos presos foram mais severas, com destaque para a implementação da pena de morte e o aumento das penas como soluções eficazes.
Considerações Finais
O estudo conclui que o crime econômico continua sendo uma atividade lucrativa para a maioria dos detentos entrevistados, com retornos financeiros muito superiores aos custos. Esse cenário é agravado pela percepção de que as penas não são suficientemente rigorosas para dissuadir o crime e pela descrença generalizada no sistema jurídico e nas políticas públicas de segurança.
Em termos de políticas de enfrentamento ao crime, o artigo sugere que a criação de mais oportunidades de emprego e educação pode ser uma forma eficaz de reduzir os índices de criminalidade econômica. No entanto, para que essas políticas sejam bem-sucedidas, é necessário que sejam acompanhadas de reformas no sistema de segurança pública e no sistema penal, de modo a aumentar a credibilidade das leis e a eficácia das punições.
O artigo encerra com a sugestão de que futuras pesquisas sejam conduzidas em outras unidades prisionais, para que uma análise mais ampla sobre a economia do crime possa ser desenvolvida, oferecendo subsídios para a criação de políticas públicas baseadas em evidências.
O artigo completo pode ser baixado no link https://e-revista.unioeste.br/index.php/gepec/article/view/33279
A citação completa do texto é:
Shikida, Pery. (2024). ASPECTOS DA ECONOMIA DO CRIME EM UNIDADES PRISIONAIS DA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO: ELEMENTOS TEÓRICOS E EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS/Aspects of the economics of crime in prisons in the metropolitan region of São Paulo: theoretical elements and empirical evidence. Informe GEPEC. 28. 268-287. 10.48075/igepec.v28i2.33279.