A virtude na segurança pública
- NISP - Colunistas
- 21 de abr.
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"Fazemos homens sem peito e esperamos deles virtude e empreendimento. Rimos da honra e ficamos chocados quando achamos traidores em nosso meio. Castramos o animal e exigimos que ele seja fecundo" C.S Lewis.
A ideia de que homens e mulheres saem de casa para proteger a sociedade é,ou deveria ser, o ápice da dignidade. Contudo, a distorção de valores e o esvaziamento da natureza humana causa uma cegueira moral grave na sociedade. Especificamente, refiro-me à morte dos três policiais rodoviários federais que, em acompanhamento a um condutor de motocicleta que desrespeitou um bloqueio policial, perderam o controle da viatura e vieram a falecer.
Em qualquer outra sociedade saudável, esses homens seriam tratados como heróis. A atitude de conduzir um veículo em alta velocidade para capturar dois indivíduos suspeitos que fugiram de uma fiscalização policial deveria ser, no mínimo, esperada, e, preferencialmente, desejada pela sociedade.
Infelizmente, em um país onde o preso tem direito de passar o feriado em casa durante as famigeradas "saidinhas"; de ter auxílio reclusão; de gozar visita íntima (o termo foi proposital), perde-se a base para julgamentos morais.
A sociedade em geral olha para o bandido como uma pessoa que não teve oportunidade e esse olhar caridoso retira completamente a responsabilidade individual daquele que desrespeitou a lei. Por outro lado, a polícia naturalmente não é bem vista, pois ela é a personificação do braço do Estado para punir quem descumpre as normas.
Essa distorção ideológica que foi construída sem armas, mas se apoiando em uma guerra cognitiva e narrativa, estraçalhou as bases morais da sociedade.
Voltando ao caso dos heróis da PRF, vejo vários comentários de "cidadãos" que criticaram a postura dos policiais.
Comentários nas redes sociais a respeito da conduta dos policiais rodoviários como: "estavam sem cinto?", "foram imprudentes quanto à velocidade", "PRF colocando a vida das pessoas em risco", "policiais despreparados", "morreram e colocaram dezenas em risco" comprovam o que pretendemos pontuar: nenhuma culpa ser imputada aos infratores que furaram a barreira da PRF. Porque foi a conduta destes que provocaram, em último caso, o falecimento dos agentes.
Paradoxalmente, se os indivíduos tivessem desrespeitado a barreira e alguém tivesse filmado, os comentários seriam: "vejams só, recebem muito dinheiro para se omitirem", "por que não foram atrás? provavelmente estavam armados", "só querem multar as pessoas de bem". A sociedade nunca estará satisfeita com o trabalho da polícia.
Fato é que a mentalidade popular foi jogada contra a polícia. Não existe mais atitude correta por parte da qualquer corporação que defenda a lei: se o policial - cumprindo seu dever legal e íntimo - persegue o criminoso e aquele morre durante o evento, a culpa é do agente público; se prefere se omitir - inclusive para não responder administrativamente perante a corregedoria por "excesso de força" -, também é criticado. Não há saída.
Como lembra Roberto Motta: "Uma sociedade que não consegue condenar moralmente seus criminosos jamais conseguirá condená-los judicialmente"
Diariamente os policiais são castrados da sua vontade de prender o criminoso. A política de segurança pública deixou de ser diminuir a criminalidade e passou a ser fiscalizar a polícia e diminuir sua letalidade - sem que isso signifique concretamente qualquer efetividade em resolver o grave problema.
Fazemos a pergunta: em qual localidade a conduta de amputar e restringir a liberdade de agir da polícia ajudou a diminuir o cometimento de crimes?
Não somos contrários a políticas que equipam policiais com armas de menor potencial ofensivo, e também não somos favoráveis a políticas que protejam policiais violentos que utilizem excesso de força. Somos, sim, contrários a políticas que fazem da exceção a regra: tratando a atuação dos policiais como presumivelmente erradas, abusivas e, pior ainda, criminosas.
A partir do momento que o próprio Estado castra o uso da força pela polícia, por motivos puramente ideológicos ou políticos, ele torna tal uso ilegítimo. Uma operação policial que - inevitalmente - acaba por matar criminosos, bem como apreende armamentos e drogas, é objeto de insistentes reportagens. Não para reportar a eficácia da ação, mas sim para considerá-la como um "fracasso" simplesmente por causar a morte de indivíduos, sempre ignorando o fato de que normalmente são regiões absolutamente conflagradas, dignas de locais em guerra, onde mortes são sempre lamentadas, mas muitas vezes inevitáveis.
Se a polícia impede uma manifestação desordeira, mesmo com o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo, ainda assim ela será considerada opressora. Se ela não intervém eficazmente, ela será julgada como conivente.
No final das contas, não se trata mais de questionar as escolhas operacionais das polícias, mas sim de refletir para onde nosso País está caminhando. Quando foi que perdemos a coragem de lutar pelo correto e punir o errado? Onde foi parar nosso senso de justiça e nossa crença nas instituições?
Poderíamos aqui citar vários motivos para homenagear os colegas da PRF e criticar veementemente os suspeitos que fugiram da barreira policial e, no limite, causaram a morte dos agentes.
Mas basta dizer que, conhecendo na prática o serviço policial, os colegas apenas fizeram o que precisava ser feito. Não é necessária análise profunda da lei ou mesmo empírica da situação para entender que a polícia, principalmente rodoviária, precisa dar uma resposta a quem desrespeita um ponto de bloqueio. Se essa resposta não for dada frequentemente, qual é o incentivo que as pessoas terão para respeitar bloqueios ou ordens de parada?
Apesar de tudo indicar que não vale a pena o risco de ser policial, ainda existem homens e mulheres que preferem morrer do que ver o errado e se omitirem. Se pudéssemos perguntar aos agentes da PRF, mesmo depois da morte, talvez a resposta deles ainda seria: "teríamos feito tudo de novo, da mesma forma". Simplesmente não conseguem entender ou aceitar que ainda existem policiais que arriscam verdadeiramente a própria vida para salvar a alheia.
Fica aqui nosso respeito a todos que colocam a vida em risco em favor de uma sociedade que muitas vezes não a merece, tudo em nome de um Estado moralmente falido.
"Há dois tipos de injustiça: a primeira se encontra naqueles que prejudicam os outros, a segunda, naquele que falham em proteger outra pessoa do prejuízo quando podem" (Romano. Cícero, De off)