Por Rodrigo Pimentel - Capitão veterano do BOPE- RJ, roteirista de Tropa de Elite 1 e 2

No mesmo dia em que recebi esta inédita, importante e preocupante pesquisa, apenas algumas horas depois, para ser mais exato, descobri que um jovem amigo, que há pouquíssimos anos tinha ingressado nos quadros da Polícia Civil e que ainda estava na sua primeira lotação, pediu desligamento da corporação.
O que poderia ter ocorrido? Como um jovem entusiasmado e apaixonado pela carreira, que
como muitos outros se dedicaram anos com afinco para passar em um concurso muito disputado, desiste do nada? Ainda mais num país onde vagas de emprego formal são escassas, e a carreira pública oferece estabilidade e aposentadoria.
A resposta estava na minha frente... nesta pesquisa que eu acabara de ler. Não se tratava de um jovem geração millenium, sem vocação, que pediu pra sair em função de baixos salários ou de incansáveis plantões de feriados e fins de semana. Se tratava, no entanto, de um jovem, como me afirmou, que buscava fugir de infindáveis frustrações e preservar sua saúde mental.
Somente menos de um décimo dos policiais ouvidos pela pesquisa afirmam que a carreira corresponde com as expectativas do concurso, ou seja, temos uma massa de profissionais visivelmente decepcionados, trabalhando em quarteis e delegacias para servir e proteger a sociedade. Mais de dois terços dos policiais ouvidos receiam ser vítima de colegas com distúrbios psicológicos. Isso demonstra que há uma massa de servidores mais preocupados com uma possível ameaça do colega, devido a questões ligadas à saúde mental, do que propriamente com as atividades rotineiras de investigação e de policiamento ostensivo.
Jornadas excessivas de trabalho, frustrações, não vislumbrar nenhum tipo de ascensão profissional, acreditar que boa parte de seus chefes estejam mais preocupados com suas carreiras do que propriamente com as atividades policiais, sequer ter a expectativa de um dia ser um gestor no nível tático. E por fim, ao pedir demissão, não ser procurado pelo departamento de pessoal, pela chefia da corporação, por uma equipe de psicólogos para tentar uma retenção ou pelo menos para saber o motivo do pedido de demissão e desejar boa sorte na volta à vida civil. Aliás, foi isso que aconteceu com meu amigo.
Talvez a glamourização provocada pelo cinema venda aos jovens uma expectativa falsa sobre o que realmente é ser policial no Brasil. É certo que a pesquisa é alarmante e nossos policiais precisam de ajuda, como por exemplo, a possibilidade de ascender na carreira, a recuperação da autoestima, o auxílio psicológico e mais importante, uma polícia de entrada única que desperte sempre o sonho de permanecer e crescer na profissão.
Texto publicado no Prefácio da Pesquisa Sobre Saúde Mental do Policial Brasileiro, publicada pelo NISP em 2023, disponível em